07
May 11
MJ I – Killer Despacho from Mars
Durante os meus 3 anos no Ministério da Justiça vi muito despacho com elaborada linguagem. Mas este que transcrevo ficou-me especialmente na memória…
“Acolhendo, por concordância, a presente informação e tudo quanto lhe está subjacente, que consubstancia o delineado plano global de informatização integral, impõem-se-me agora introduzir este projecto à superior ponderação de V. Exa.
Entre o tudo e todo o demais que tem de passar ao prudente crivo de V. Exa., ganha especial proeminência a aferição do mérito absoluto, bondade relativa, oportunidade e possibilidade efectiva do dispêndio econonómico-financeiro que ora se aponta realizar.
Coincidentemente, em razão do que pode ser a transformação decisiva que se anteolha como resultado útil de todo este esforço a empreender, não pode deixar de ser anotada para adequada avaliação neste instante inicial e preambular a susceptibilidade de a mudança – senão mesmo a sua sugestão – poder provocar incomodidade laboral, com os eventuais e consequentes movimentos.
V.Exa. melhor completará.”
Perceberam? Eu à primeira também não percebi. À segunda também não. Levei ao Hugo para ele ler e ele também não percebeu patavina. Levámos ao Rui e até ele teve alguma dificuldade…
Versão curta: “Se quer fazer a informatização integral, você é que sabe, veja lá se tem dinheiro suficiente. E prepare-se que o pessoal vai ficar chateado e ainda vêm para aí os sindicatos com protestos e o caraças. Tás sózinho.”
30
Apr 11
Esoterica V – Sexo, Mentiras e Video
Este ainda não é o post com a bomba atómica do Golias. Esse vem mais tarde. Mas entretanto lembrei-me de um episódio que merece um curto post.
Aos belos dias de 18 e 19 de Março do ano 1996, a Esoterica estava presente na conferência Internet 96 organizada pelo Centro Atlântico.
Já tinhamos estado presentes no Internet 95, talvez a primeira conferência sobre Internet em Portugal e que decorreu da forma mais normal possível. Tirando o facto de termos sido nós a montar o stand, o que implicou algum cansaço e que fez com que o stand fosse uma bela bosta. Notem bem os cartazes foleiros, impressos a inkjet e depois fotocopiados para formatos maiores…
Mas, dizia eu, tinhamos ido ao Internet 96. Tudo muito bem e coisa e tal. Até que chega o momento do último debate do dia. O painel já era constituido por um grupo muito maior (7+1) de ISPs, bastante mais do que o painel idêntico no Internet 95 (3).
Eu já andava pelo nariz com as merdas da PT e da Telepac (ler os episódios anteriores da saga) e com os tempos que os ditos cujos demoravam a responder aos nossos pedidos de instalação de linhas dedicadas. Quando alguém da audiência perguntou porque é que não estávamos com mais POPs em mais zonas do País, respondi curto e grosso: “A Portugal Telecom demora deliberadamente as instalações de linhas dedicadas e, para além disso, recusa-se e anda a engonhar com os nossos pedidos de locação de equipamento nas centrais da PT, coisa a que são obrigados por lei”.
Oh! meu amigo… O Eng. Iriarte Esteves, na altura à frente da Telepac, levanta-se da audiência aos gritos: “ISSO É MENTIRA! NÃO É VERDADE!”… Coisa rara e nunca vista, alguém interromper uma resposta de um membro de um painel. Também raro e nunca visto alguém conseguir bater-me na falta de calma e de tacto…
Nunca cheguei a perceber o que é que seria mentira, se os atrasos ou se a obrigação de permitir o acesso às centrais. O resto do painel, até aí caladinhos que nem ratos, a seguir toca de confirmar a minha afirmação e toca de malhar na PT e na Telepac. Quanto ao Eng. Iriarte Esteves, quando a palavra foi devolvida para contraditório, tinha-se ido embora. As vantagens de um gajo ser quase monopolista é que pode mandar os outros todos badamerda.
Esta foi a parte do “Mentiras”…
A parte do “Sexo” tem a ver com outro “incidente” durante o Internet 96. Às tantas eu, o Pedro Ramalho Carlos (IP Global) e a Graça Carvalho (FCCN), começámos a falar da possibilidade de nos “casarmos” de alguma forma e tentar comprar e partilhar recursos. Fala daqui, fala de acolá, e chegámos à conclusão que o que seria melhor era criar um ponto de troca de tráfego em Portugal, para evitar que o tráfego de cada ISP fosse dar a volta aos EUA. Fomos falar com o Henrique Carreiro e desafiámo-lo a juntar-se a nós e anunciar no fim do congresso esse projecto conjunto. Nada feito. A Telepac, apesar de conversa em contrário (ver PS), só anos mais tarde chegou a participar no PIX, cobrando pela interligação e nunca tendo acedido a trocar tráfego com a Esoterica porque era um “operador pequeno”. A Telepac recusou durante muito tempo o ménage à…. uns quantos.
Finalmente, a parte do “Video”: um dia destes, quando tiver tempo, digitalizo o vídeo e coloco aqui no blog.
25
Apr 11
Os Recém Convertidos
(NOTA: este artigo foi publicado aqui na Exame Informática, na minha coluna de opinião Franco Atirador; para a semana há mais)
Não há nada pior do que um recém convertido. Desde os zelotas sicários até aos fanáticos religiosos dos nossos dias, foram sempre os recém convertidos que tiveram as atitudes mais extremistas e fanáticas.
Não há nada pior do que um recém convertido à religião da Apple e do seu Deus, Steve Jobs.
Não tenho rigorosamente nada contra o Steve Jobs. É um génio de marketing (mais do que tecnológico) que há muito tempo admiro. Tirando o ZX81, o ZX Spectrum, o Commodore 64 e um PC Amstrad 1512, os primeiros computadores que usei na Faculdade foram Macs (o Classic). Na altura fiz alguns trabalhos numa NeXT workstation (a melhor coisa que o Steve Jobs alguma vez fez e que 20 anos depois continua a ter coisas melhores do que os MacOSX e os Windows que por aí andam). Tenho uma NeXT em casa. Acho que isso diz tudo.
Não tenho rigorosamente nada contra a Apple. É uma empresa fantástica que faz sair produtos de excelência. Uma das empresas de que sou sócio, envolvida no negócio do design e comunicação gráfica, trabalha desde 1996 com Macintosh, desde o tempo dos Quadras e dos Power Macintosh, e correu os modelos todos até aos mais recentes.
O que me chateia são os recém convertidos à “religião” do Macintosh.
Durante anos não se via um Mac numa faculdade. “Por questões de compatibilidade”, diziam. “Ao fim e ao cabo depois nas empresas é o que se usa”. Isto foi a tanga que foram dando. Eram zelotas dos Windows e da Microsoft. Até que o Mac se tornou moda. A partir do momento que se tornou moda “apreciar” o design e a facilidade de uso, que já eram um facto desde a década de 80, começaram os ratos a saltar do barco Microsoft. E agora é ver a proliferação de Macs nas Universidades. E a forma sobranceira como passaram a tratar os colegas que têm um PC com Windows. São uns info-excluídos coitados.
Depois há os convertidos tecnológicos. Sabem alguma coisa mais sobre computadores do que o utilizador normal. E também entraram na moda. Diz-me um no outro dia: “não sabes o que é bom”. Um palhaço a ensinar o Padre Nosso ao vigário… E para esses não há mais nada. Só existe a Apple. Durante anos tiraram MCSEs e foram para a fila nas FNAC quando saía a nova versão do Windows. Agora vão para a fila quando sai a última novidade da Apple. Mesmo que seja igual à anterior mas com mais cores.
Ainda piores são os convertidos tecnológicos que sabem bastante mais do que os utilizadores normais. Programadores, administradores de sistemas, etc. Durante anos fizeram cruzadas contra a Microsoft. “Bandidos!”. O software era proprietário, as aplicações uma porcaria, eram monopolistas e abusadores. Bom era o Linux, isso sim. Podia ter-se controle total sobre o sistema operativo e sobre o hardware. Mas agora que usam Macs o problema já não existe. A Apple é ainda mais proprietária, mais abusadora e os Macs computadores mais fechados. Mas está tudo bem. Ainda têm a lata de dizer que “não se querem preocupar com o computador, só querem que funcione”. Incoerência e falta de moral. Durante anos o Mac era para os designers, para as meninas e para os básicos. Mas agora já serve. Está na moda. Dá status…
Eu desfiz-me dos dois, dos Windows e dos Macs. Passei a usar Linux em todas os meus computadores (o telemóvel é Android, claro). O que teve uma grande vantagem: quando vem a família e os amigos pedir suporte técnico à borla posso dizer “Não uso, uso Linux, já não sei como isso funciona”. Temos pena.
12
Apr 11
O Que Fazer ou Não Fazer Durante Uma Recessão
Com o país a meio de uma recessão não é surpresa que o assunto da economia seja preocupação de todos.
O que fazer relativamente aos problemas que temos? Bem, isso depende de quem se perguntar. Dizem por aí que precisamos de um financiamento e um estímulo de 85 mil milhões de Euro…
Mas há quem não acredite nesta típica medida keynesiana, preferência de governos socialistas. Há quem não acredite em Keynes, seguido ardentemente por uma classe política retrógrada e velha.
Aqueles que não acreditam nas teorias de Keynes contrapõem como alternativa as teorias de Friedrich Hayek (prémio Nobel de Economia, um dos mais importantes economistas do século 20). Bruce Caldwell, editor do livro “The Collected Works of FA Hayek (19 volumes)”, resume Hayek a 10 idéias-chave sobre o que fazer e não fazer durante uma recessão.
Aqui estão as 10 idéias hayekianas, alternativas a medidas keynesianas que demonstraram não funcionar durante os últimos 50 anos:
1. Recessões irão sempre acontecer. Alternância entre os períodos de crescimento econômico e períodos de estagnação ou declínio são uma parte necessária e inevitável de um mercado livre. As recessões não são aberrações, mas sim eventos dolorosos mas necessários para restabelecer o equilíbrio de uma economia.
2. Um estímulo só vai estimular o défice: a experiência do passado com as tentativas de alterar a economia mostram que políticas monetárias e fiscais anticíclicas podem muitas vezes ter resultados muito piores (como na década de 1970). Os políticos inteligentes devia pois ser aconselhados a não se intrometerem, por muito que os seus instintos lhes digam para mostrar aos eleitores que estão a fazer alguma coisa.
3. Um mercado puro laissez-faire também não funciona: são necessárias algumas regras para os indivíduos poderem realizar os seus planos e para o mercado a funcionar. São necessárias regras gerais, igualmente aplicáveis a todas as pessoas, destinadas a serem permanentes (ainda que sujeitas a revisão, com o crescimento do conhecimento) e que forneçam um quadro institucional no qual as decisões quanto ao que fazer e como ganhar a vida são deixadas para os indivíduos.
4. Planeamento central e regulamentação excessiva não funcionam: o desejo de planear e de submeter a economia aos caprichos dos Estados colocam a liberdade em risco. Como Hayek observou de forma sucinta: “quanto mais o Estado planeia, mais difícil se torna o planeamento para os indivíduos.”
5. A economia é demasiadamente complexa para previsões precisas: como Yogi Berra disse: “Odeio fazer previsões econômicas. Especialmente sobre o futuro.” Não é que não saibamos nada sobre a economia, mas o que sabemos revela os limites de nosso conhecimento e, consequentemente, da nossa capacidade de planear centralmente.
6. Convém lembrar a regra das consequências imprevistas: a história mostra que quando se tenta atingir certos fins, em especial quando a sua realização implica interferir com o funcionamento dos mecanismos de preço das economias, todos os tipos de efeitos perniciosos ocorrerão, efeitos esses que não faziam parte do plano original
7. Muitos políticos e governantes fariam bem em assistir a umas aulas de Economia do 1º ano: enquanto Hayek repetidamente apontou para as limitações inerentes a uma disciplina que lida com um sistema complexo como a economia, os princípios básicos da economia de escassez, da oferta e da procura, da divisão do de trabalho, etc, podem explicar muito sobre o mundo e, mais importante, ajudar a excluir certas respostas políticas inadequadas (por exemplo, os preços máximos).
8. Convém esquecer a história da “justiça social”: os mercados livres conduzem necessariamente a uma distribuição desigual de riqueza e, inevitavelmente, levam por isso aos clamores para que haja “justiça social igualitária”. Tais clamores de “justiça” são injustificados uma vez que não têm nada a ver com um processo impessoal de mercado e são também perigosos uma vez que esquemas distributivos presumem que possuímos todo o conhecimento necessário que, de facto, nunca se pode possuir (ver #5).
9. Nada é melhor que o livre mercado: Hayek admitiu se tivéssemos mais conhecimento sobre o mesmo, poderíamos fazer muito mais para melhorar o mundo através de planeamento e regulação. Mas não sabemos. E o que sabemos, no mundo globalizado e disperso em que vivemos, é de facto devido ao funcionamento do mecanismo de mercado.
10. Como regra geral, as intervenções dos Governos não são apenas emendas piores do que o soneto, mas podem levar a problemas ainda mais sérios: quando se pensa que os burocratas têm incentivos para maximizar a burocracia; que os políticos procuram ser reeleitos e portanto têm um incentivo ao aumento da despesa e à diminuição de impostos, e que as empresas têm um incentivo para eliminar concorrentes quando conseguem influênciar os Governos e vivem à custa do Estado, conclui-se que o mercado livre continua a ser a nossa melhor opção (ver item 9).
(traduzido e adaptado a partir de “Hayek’s Top 10 Do’s and Don’ts in a Recession”)